quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Equilíbrio

Equilíbrio - Significado

1 posição estável de um corpo
Ex: perder o equilíbrio e cair
2 igualdade quantitativa
Ex: o equilíbrio entre as receitas e as despesas
3 estabilidade mental
Ex: equilíbrio mental
4 harmonia
Ex: o equilíbrio das formas de uma estátua


Bom, depois de um longo tempo, estou de volta aqui no meu Blog.


Obrigado a todos que têm lido. Sei que muitos gostam, mas outros acham que, contando as minhas experiências de vida, estou me expondo demais. Eu não me considero uma pessoa muito discreta e às vezes acho até que falo demais, que sou “um livro de páginas abertas” como dizem. Mas, se dividir experiências que causam sentimentos bons nas pessoas, porque não o fazer? Então, VIVA a minha exposição! rs


Nesta postagem, vou contar mais um capítulo da minha vida, capítulo este que me marcou demais, pra sempre. Prepara-se porque a leitura vai ser longa.


No meu último relato, contei sobre a minha aventura de como foi a minha vida a bordo de um navio de cruzeiros durante seis meses. E foi lá onde essa próxima história começou..


No dia 22/12/09, o navio que eu estava a bordo, iria parar no porto do Rio de Janeiro, que era uns dos destinos do cruzeiro que estávamos fazendo. Uma das condições do navio para quem quisesse desistir do trabalho e desembarcar era que a companhia não pagaria a passagem de volta do individuo, portanto, se eu quisesse desembarcar antes do término do meu contrato eu teria que pagar a minha passagem de volta pra casa do porto em que eu desembarcasse.

Dias antes de chegarmos ao Rio, pedi ao meu encarregado que comunicasse o Maitre que eu queria pedir “sign off”, ou seja, cairia fora do navio no dia 22/12, no Rio, já que de lá eu não gastaria muito com a passagem de volta a São Paulo (home sweet home).


Pra minha surpresa, o próprio Maitre veio falar comigo pra saber o motivo do meu pedido. Expliquei que eu não havia me adaptado ao ambiente, que ficava mareada demais, etc....Naqueles dias, eu ainda estava trabalhando no restaurante dos tripulantes e já não agüentava mais aquele ambiente. Foi ai que o Maitre me pediu pra ficar e a partir daquele dia me transferiu para o Buffet da área de passageiros. Então, decidi desistir de desembarcar – essa decisão mudou toda a minha vida.


Quase um mês antes do término do meu contrato, um filipino – ganhador do concurso Star Prince 2009, como o homem mais bonito do navio – que há meses vinha tentando se aproximar de mim, finalmente conseguiu (rs). O cara era bonitão sim, mas eu não queria me envolver nos últimos minutos do segundo tempo, porém, minha carência falou mais alto e caí na lábia do galã. Ficamos o meu último mês juntos, “namorandinho”.


Finalmente a última semana chegou. Apesar dos dias anteriores terem sido muito tensos devido ao terremoto que atingiu o Chile, as festas de despedidas não paravam, até porque muitos desembarcariam no dia 13/03/2010.


O último dia chegou e não fui trabalhar (como eu disse no meu post anterior). E apesar de toda a confusão eu estava aliviada de estar indo pra casa.


A chegada ao Brasil foi tranqüila. O reencontro com a família e amigos é sempre emocionante. O cansaço de seis meses de trabalho sem parar, estava estampado no meu rosto. Mas foi grande a alegria de chegar a minha casa...ops...minha casa??? Eu não tinha casa, bom, a casa da minha mãe.


Família e amigos no aeroporto

Depois de tanto trabalho era justo eu tirar uns dias de folga pra descansar e relaxar um pouco. Aproveitei pra curtir a família, visitar amigos e sair para dançar de vez em quando.

Quase um mês depois que desembarquei, ainda tentando parar de ter pesadelos com o mar, um amigo me convidou pra ir a sua chácara em Itupeva. A chácara era linda! Havia piscina, churrasqueira “com churrasco”, rede e uma grande área verde. Estávamos entre amigos e não faltava nada, tudo estava perfeito, exceto o fato de estar “atrasado” pra mim. Mas como minha irmã havia me obrigado a fazer um teste gravidez de farmácia uns dias antes daquele e este fora negativo, fiquei tranqüila e curti. Curti tanto que dava até bombinhas na piscina e peixinhos na grama na hora do vôlei.


Naquela noite, senti uma cólica absurdamente dolorida. Tive até vertigem. Porém, achei que poderia ser um bom sinal, sinal vermelho a vista.


No dia seguinte fui ao médico e ele me aconselhou fazer um Beta HGC, que é o exame que me daria mais certeza de estar grávida ou não.


Dois dias depois, minha amiga praticamente me empurrou até o hospital onde fiz o tal exame que ficaria pronto em duas horas. Nem preciso falar que foram as duas horas mais longas da minha vida, mas não longas o suficiente para que minha irmã e meus dois amigos chegassem a tempo para saber o resultado comigo. Eles, praticamente, estavam torcendo para que desse positivo (pimenta nos olhos dos outros é refresco né?), mas eu achava seria negativo, pelo menos era o que eu queria.


Passadas as 2 horas, a doutora aparece e chama o meu nome. Eu quase morri. Entrei na sala e ela logo me perguntou: “Por que os seus amigos estavam rindo?” Eu disse que era porque eles achavam que eu estava grávida e que eles iriam cair do cavalo. Ela olhou pra mim com um sorrisinho e disse: Não vão não. Parabéns! Você está GRÁVIDA!


Acho que toda mulher deveria ser filmada no momento em que ela recebe a notícia de que ela está grávida. A gente fica com cara de nada e de tudo, ao mesmo tempo. Todos os sentimentos vêm à tona em um segundo. Daí vem o primeiro significado da palavra do meu título Equilíbrio = posição estável de um corpo. Senti como se não tivesse o chão, sem equilíbrio.


Recuperei o ar e saí da sala com essa tal cara e, é claro, meus amigos estavam ansiosos e logo ficaram felizes com a notícia, afinal de contas era uma gravidez e não uma doença. Pelo menos essa vantagem a mulher tem em relação ao homem – temos o poder de dar a vida à outra vida. E essa sensação de ter um serzinho dentro de nós é inexplicavelmente maravilhosa.


Bom, deixando as sensações de lado, a realidade era que eu estava grávida de um ex-namorado temporário filipino, que talvez eu nunca mais encontrasse novamente na minha vida.


Ter o bebê era algo decidido. A questão era como eu iria lidar com aquela situação sem ter o pai dela presente. Eu havia acabado de chegar ao Brasil e não estava sequer empregada ou com um convênio médico.


As questões negativas pareciam gritantes em relação às positivas. Foi ai que o segundo significado do meu título Equilíbrio = igualdade quantitativa me ensinou que as coisas que se opõe ou se contrastam devem estar em igualdade. Não é bom que um dos dois lados esteja muito diferente do outro (a não ser que a minha conta bancária fosse bem maior que as minhas despesas :-))


Quando surge uma dificuldade, a gente vai logo reclamando, murmurando e acabamos, com isso, transformando essa dificuldade bem maior do que ela realmente é. Então, percebemos que nem tudo é tão ruim quanto parece ser e que, se olharmos bem, poderemos ver o lado bom das coisas, e então, o equilíbrio.


Eu juro que tentei fazer isso no início, mas não conseguia. A ficha ainda não tinha caído. Mas os dias foram passando e eu tive que seguir em frente e tomar uma decisão. Mudei-me da casa da minha mãe e fui morar com minha irmã Dani em um apartamento alugado de um amigo meu em São Paulo.


Comecei a dar aulas de inglês e a fazer traduções. Sempre gostei de me expressar, falar em público, lidar com pessoas e esta oportunidade veio bem a calhar. Encarei isso como uma chance de trabalhar pra mim mesma, o que era um desejo antigo. A grana não era muita, mesmo porque eu não ocupei todos os meus horários, já que teria que ir ao médico e fazer exames constantemente, mas deu pra me virar bem.


A gravidez em si foi ótima, bem tranqüila. Quase não senti enjôos e nem tive muitos desejos - ainda bem, pois quem eu iria acordar de madrugada pra pedir algum desejo? Minha irmã? Até tentei pedir uma coca-cola um dia à noite, mas ela me respondeu: “E eu com isso?” rs. Ela falou brincando, claro, até porque minha irmã foi o meu maridão nesse periodo. Me ajudou demais!! (Dani, te amamos!)



 Os meses estavam passando e a barriga nada de aparecer. Fui ao médico pra saber o sexo do bebê e, como nada é fácil na minha vida, não puderam ver, mas deram 70% de chance de ser menina. Confesso que nunca me imaginei mãe de menina, mas fiquei feliz assim mesmo. Na segunda vez que fiz exame, ainda não deu pra ver o sexo, mas aumentaram a chance para 90%. Minha barriga já tinha resolvido crescer, quando aos sete meses foi confirmado – era uma MENINA (ufaaaa, achei que só saberia no parto!).

Chupando o dedinho dentro da barriga!
Escolher o nome, do contrário do que pensam, não é uma tarefa muito fácil, até deveria ser no meu caso, já que só dependeria de mim. Digo até que, ao invés de enjoar de comida ou cheiro, acabei enjoando de nomes. Nenhum me agradava, até que escolhi NICOLE.


Nicole sempre foi bem agitada, como a mãe, e nunca deixou de me chutar. Todos os dias era um treino de futebol, chutes pra todos os lados. A sensação é incrível, mas dolorosa de vez em quando. E à medida que ela crescia, crescia também a ansiedade de saber como ela seria, com quem ela se pareceria, como seriam os seus olhinhos, a boquinha, se seria perfeita, enfim, por que o dia do parto não chegava nunca?


No final da gravidez, tive que tomar uma decisão que eu não queria – voltar pra casa da minha mãe depois do parto. É claro que muita gente aos seus 30 anos de idade já está com a vida estável financeiramente, bem sucedida na carreira, sabe o quer da vida, etc...Mas esse não era o meu caso. Eu havia escolhido viajar pelo mundo, conhecer pessoas de diferentes culturas, ter aventuras e experiências para contar e, com isso, minha estabilidade financeira e aquisição de bens ficaram em segundo plano. E não que eu não goste da casa da minha mãe, mas ao voltar a morar lá é como se eu estivesse regredindo, voltando para um estágio anterior. Mas era o melhor a fazer. Mãe é sempre mãe. Sei que poderia contar com a ajuda dela.


Na 40a semana de gestação eu parei com as aulas e esperei, esperei e continuei esperando os sinais que tanto falam que ocorrem quando chega a hora do bebê nascer, mas nada da Nicole dar estes sinais. Eu fazia tudo o que me diziam pra fazer para ajudar na hora do parto: exercícios, danças, natação, respiração, mas acho que nada funcionou.



Já estava na 42a semana quando fui para o hospital com as “aparentes” contrações, as 7hs da manhã do dia 09/12/10. Às 9hs me internaram e iniciaram uma indução, já que eu só estava com 1,5 cm de dilatação. Durante todo o dia eu não senti nada. Ficava frustrada de tanto ver mulheres chegando para terem bebês e minutos depois já estavam com eles em seus braços. Mas comigo, claro, iria ser um pouco mais difícil. Às 18hs pedi para a Maria, minha amiga, ir embora para descansar, porque achei que a Nicole só nasceria no dia seguinte. Eram 22hs quando o primeiro frasco do medicamento acabou (pra mim aquilo era água, o medicamento mesmo veio em seguida) e logo colocaram outro. A partir daquele momento eu só vi estrelas. As contrações vieram exatamente como dizem que são: a pior dor que existe! E como não bastasse, aumentaram a dosagem do medicamento. Lá pelas 3hs da manhã, sozinha, não sabia nem mais o meu nome, a dor era insuportável e nem havia mais intervalos entre as contrações. As enfermeiras passavam pela porta e pareciam evitar entrar no quarto da coitada que estava sofrendo por não ter dilatação. Teve uma hora que cheguei a arrancar do meu braço aquelas agulhas e a desligar o aparelho de dosagem. Nunca imaginei sentir uma dor daquela. Eu só pensava em quando aquilo iria terminar. Foi nessa hora que precisei aprender o outro significado do meu título Equilíbrio = estabilidade mental. Quando a dor física atinge um nível muito alto, podemos até ter delírios e a sensação de que estamos enlouquecendo. E manter a estabilidade mental nesse momento é muito, muito difícil, pois só pensamos na dor e quando ela vai parar. Acredito até que o mesmo aconteça com a dor não-física. A solução para o meu equilíbrio foi pensar no mundo como um todo, não isolando a minha dor, nem fazendo dela a única dor de alguém do mundo. Dizia pra mim mesma que o tempo nunca pára e que tudo passa, inclusive aquela dor. No mais, eu tentava respirar fundo e não contar os minutos, nem as horas, nem o tempo.


Às 9hs da manhã me disseram pra eu tentar tomar um banho quente pra ver se ajudava na dilatação que, mesmo depois de uma noite inteira de indução, ainda estava só com 8 cm. Eu tremia muito de tanta dor e mal conseguia parar em pé com aquele barrigão. E foi nesse estado que minha irmã me encontrou ao chegar no banheiro do meu quarto. Assustada, ela tentou me ajudar. Pedi pra ela que chamasse alguém porque eu não aguentava mais, queria uma cesárea. A médica apareceu depois de uma meia hora e decidiu tentar o parto. Foram duas horas de tentativas frustradas. A Nicole não queria nascer. Eu já estava exausta, sem forças e quase desmaiando, quando me mandaram para o andar de cima. Pensei que fariam uma cesárea, mas assim que me deram a anestesia rack, me explicaram que fariam o parto fórceps. Depois da anestesia eu já nem me importava com qual procedimento eles usariam, contanto que fizessem a minha filha nascer logo. Foi bem rápido e quando me dei conta, ela já estava ali, nos braços do enfermeiro. Eu nem acreditava que tudo aquilo tinha passado. Nicole já tinha vindo ao mundo e o que eu mais queria era estar perto dela, olhar pra ela e esquecer todo aquele sofrimento. Depois dali, nós nunca nos separamos. Ficamos todo o tempo juntas no quarto e passados os três dias no hospital, fizemos um tour pela casa da vovó Maria (avó postiça - te amamos Mary), de lá para o apartamento onde morávamos com a titia Dani, de lá para a casa da titia Patrícia (te amamos titia) e, finalmente, para a casa da vovó Conceição (te amamos bobó Ceição), aonde iríamos nos conhecer melhor.



Apesar das dificuldades de ser uma “mãe solteira”, eu sempre agradeço a Deus pelo presente que ele me permitiu ter, a Nicole. Se eu tivesse desembarcado no Rio dois meses antes do término do meu contrato, eu não ficaria grávida, mas a Nicole não estaria comigo hoje, e hoje, já não vejo a minha vida sem ela.

É Deus permitindo que a conseqüência do nosso erro não tenha um peso de um erro? Ou é Ele quem nos permite errar para que aconteça o que tem que acontecer em nossas vidas? Nunca saberemos ao certo, mas de uma coisa eu tenho certeza - Ele está sempre comigo! Por isso, sigo PRATICANDO A VIDA tentando me equilibrar com o último significado do meu título Equilíbrio = harmonia.


Fiquem com Deus!


Viviane Brizzi

sábado, 28 de agosto de 2010

A bordo de um navio por 6 meses.

Quando voltei da Irlanda, demorou alguns meses para eu me readaptar ao Brasil. Viver em um país desenvolvido, com qualidade de vida, uma boa economia (na época), sem violência, onde é muito fácil e barato viajar para outros países, e depois ter que voltar para o Brasil, não é fácil. É verdade que amamos o Brasil e nos orgulhamos de ser brasileiros. Mas é verdade também que se pudéssemos reunir todas as pessoas que amamos em um país mais seguro e com mais qualidade de vida (com calor também), com certeza o faríamos. Aproveitaríamos o Brasil somente para tirar umas férias.

Ao invés de encarar a difícil readaptação, decidi tentar outra viagem, mas desta vez sem investir muito – um trabalho em navios de cruzeiros, por exemplo – eu não gastaria muito dinheiro e viajaria por vários lugares durante alguns meses. Essa idéia me parecia boa, sem falar que algumas amigas minhas já haviam vivido essa experiência e gostaram muito, porém, ressaltaram que o trabalho não era fácil e a carga de trabalho era de, no mínimo, onze horas diárias.

De qualquer forma, resolvi enviar meu currículo para algumas agências que fazem a seleção (Ceceth, Fato, Seaman, etc...). Não demorou muito e já recebi uma ligação da Ceceth. Foi praticamente uma entrevista por telefone, inclusive, testando o meu inglês. O rapaz que ligou pareceu um tanto satisfeito com a entrevista e já me perguntou se eu tinha interesse em ocupar uma posição na área de restaurante em um dos navios da companhia Princess, uma das maiores cias de navios do mundo. Sem hesitar, respondi que SIM. Ele me disse que mandaria em seguida um email com todos os detalhes.

Será? Tudo costumava ser tão difícil e dessa vez estava parecendo muito fácil. Bom, como prometido, recebi um email com “quase” todos os detalhes. Havia mais informações sobre como seria o processo seletivo e os valores que seriam cobrados referentes à inscrição e ao curso que seria ministrado pela empresa Selection Partners sobre “vida a bordo”. No total, eu iria investir aproximadamente uns R$ 1.200, incluindo os custos para tirar o visto dos EUA.

Primeiro, participei de um treinamento seguido de um teste e, se eu passasse nesse teste eu seria entrevistada pela “Mrs Princess”, a senhora que estava representando a Cia de Cruzeiros. O treinamento e o teste foram relativamente fácies. O difícil foi encarar a entrevista em inglês com uma mulher super arrogante e ainda por cima ter falar de assuntos relacionados à restaurante, coisa que eu não era tão familiarizada assim, afinal de contas eu havia trabalhado em pubs e restaurantes na Irlanda, mas ocupando funções do tipo “cata copos” e não o de garçonete, exceto por umas três semanas, quando cobri férias de uma garçonete italiana. Mas que fosse o que Deus quisesse! E Deus quis, fui aprovada para a vaga Assistant Buffet Stewards – o nome era bonito, mas só o nome.

Depois de aprovada, paguei o valor referente ao curso, providenciei o meu visto dos EUA (que também deu certo), os exames e as vacinas solicitadas pela Cia e no dia 11/05/09 entreguei todo o processo. Fui informada que eu deveria esperar de um a quatro meses para ser chamada para embarcar. Eu, otimista, pensei que seria chamada no 1º mês. Puro engano. Já estava no final do 3º mês e nada. Eu já havia procurado alguns trabalhos temporários antes, mas nenhum tinha dado certo, até que uma empresa me ofereceu uma vaga efetiva na época e eu aceitei. A minha idéia era ficar nesse trabalho e esquecer o navio, caso eu achasse que aquela era uma boa oportunidade, se não, deixaria o trabalho e embarcaria.

Dia 24/08/09 recebi uma ligação da agência informando que o meu embarque seria no navio Star Princess, dia 09/09/09 no Alaska com vôo que sairia de SP dia 07/07/09. “Posso confirmar o seu embarque?”. Dá pra imaginar a sensação que senti ao ouvir essa pergunta? Num dia comum, estava eu em SP, na hora do almoço, conversando com minha amiga Maria, só pensando em coisas simples do trabalho ou algo do tipo e, de repente, sou informada de que em alguns dias eu embarcaria para os EUA-Alaska pra passar 6 meses a bordo de um navio, viajando por todo o mundo. Loucuuura, não é!? Com um “friozão” na barriga, sem hesitar, respondi SIM, novamente.

Dia 07/09, mais uma vez, estava me despedindo da família e dos amigos, rumo ao Juneau, capital do Alaska, com escala em Seattle e Atlanta, indo para uma nova aventura.

Aproveitei para dar uma passeada em Seattle e Atlanta enquanto esperava a hora dos vôos e finalmente pegar o último vôo para Juneau – o pior vôo da minha vida. Era um vôo doméstico, bem pequeno, daqueles que a aeromoça pára pra conversar com os passageiros, aliás, só havia duas. Uma delas parou pra conversar comigo e depois de saber o motivo da minha ida ao Alaska, me anunciou nos alto-falantes do avião dizendo que eles tinham a bordo uma tripulante da famosa Cia de Cruzeiros, Princess. Foi uma situação muito inusitada. O problema foi o vôo em si. Uma tempestade muito forte caía naquele lugar e o avião se mexia mais que carroça na BR-452 Itumbiara-Rio Verde (a estrada mais esburacada do Brasil). Naquele momento, cheguei à conclusão de que eu era maluca mesmo, bem que minha mãe me dizia.

Sã e salva cheguei ao hotel onde me hospedaria até o dia seguinte, quando seria o meu embarque no navio.

Estas são algumas fotos tiradas do hotel em Juneau. Olhem a minha alegria!


Quando avistei pela primeira vez o navio onde seria a minha casa nos próximos seis meses, fiquei surpresa com o grande porte dele. Foi uma sensação inexplicável, boa e má ao mesmo tempo. Boa, porque eu estava indo rumo a uma nova aventura cheia de novas experiências e viagens. Má, porque de alguma forma aquilo seria uma prisão. A verdade era que eu não sabia o que me esperava, portanto, tudo era desconhecido.

Meu primeiro dia foi uma lástima, mas engraçado. Conheci o meu supervisor, um português chamado Alberto. Um homem aparentemente bem legal. Ele me auxiliou com os assuntos de uniformes, apresentação do navio e onde seria o meu lugar de trabalho, que para a minha surpresa era o “Crew Mess” – o refeitório da tripulação (fora os restaurantes dos passageiros, havia mais dois, um para os Staffs e outro para os Oficiais). Logo entendi que a hierarquia naquele lugar reinava soberanamente e que a minha posição estava bem no pé da pirâmide de hierarquias. Trabalhar no Crew Mess significaria exercer a função mais baixa do navio, a qual todos odiavam. Foi ótimo saber disso somente naquele momento.

Crew Mess

Arrumei as minhas coisas na cabine, que era um ovo, e logo conheci a minha “cabin mate”, com quem eu iria dividir o ovo. Na cabine havia um beliche, um pequeno armário, uma pia e um banheiro que era dividido com a cabine vizinha, ou seja, um banheiro para quatro pessoas (só descobri isso porque ao utilizá-lo a vizinha abriu a outra porta e me flagrou em uma situação bem constrangedora - que ótima primeira impressão!). Em seguida, tomei um banho, coloquei aquele uniforme que mais parecia uma fantasia e fui para o meu local de trabalho, o “Crew Mess”. Eu, pra variar, havia levado um “Scarpin” preto para trabalhar (pra quem não sabe, este é um salto alto de bico fino), o que foi motivo de muita risada. Não entendi o porquê na hora, mas de qualquer forma tive que comprar um novo par no almoxarife do navio, um tipo que parecia masculino, mas era antiderrapante, seguro e horrível.  O mais engraçado estava por vir – o momento em que começariam a me ensinar o trabalho (não é Bárbara? rs). Minhas atividades eram: manter as mesas, o chão e as linhas de buffet limpos, e manter vazios os “trolleys”, uma espécie de bandejeiro grande com rodinhas e pesado, onde a tripulação colocavam suas bandejas sujas depois de comerem. Foi isso o mais engraçado. Imagine, eu, desastrada como sou, ter que empurrar esses badejeiros de um lado para o outro do refeitório. E imagine agora, eu, com um salto alto de bico fino fazendo isso. Muito engraçado mesmo. 


Este é um vídeo mostra como são as cabines - by Barbara

         
                      Sapatos Scarpin                        Sapatos antiderrapantes do navio

Trolleys que tínhamos que empurrar (Sylvia e Barbara - Crew Mess)

Como a adaptação é uma habilidade do ser humano, logo me acostumei a lidar com os “trolleys”, depois de ter quebrados alguns copos e pratos, claro!

Trabalhei cerca de um mês e meio no Crew Mess, mais um mês e meio no Staff mês (que era um pouco melhor). Em seguida, finalmente fui para o Buffet dos passageiros e logo depois para o Café Piazza, onde era o melhor lugar para se trabalhar (se tratando da área de resturante). Lá era um local onde aconteciam vários shows. Um lugar muito agradável para trabalhar. Foi lá onde eu vi pela primeira vez um verdadeiro show de tango argentino. Realmente lindo!

      
Banda e dançarinos argentinos de tango.   

Difícil mesmo foi ter que se adaptar à falta de privacidade e liberdade, diferentes culturas e, principalmente, o excesso de horas trabalhadas. Chega uma hora que o corpo não agüenta, a imunidade cai e os problemas de saúde logo aparecem, sem falar no estado psicológico, que fica muito abalado.

Mas eu teria que permanecer a bordo pelos próximos seis meses, então não queria ficar reclamando e continuei a vida dura.

O bom era que havia alguns tipos de entretenimentos que nos permitia relaxar um pouco nas pouquíssimas horas vagas que tínhamos. Toda semana tinha um tipo de programação do tipo: dia de cinema, karaokê, disco, jogos, etc. A maior parte dessa programação acontecia do “Crew Bar”, lugar muito cobiçado pelos próprios passageiros, mas só era permitida a entrada de tripulantes, staffs e oficiais.

Havia também uma academia e uma área externa com uma piscina e dois “ofurôs” (minha área preferida nos dias de calor, claro!).

Área da Piscina dos Tripulantes

Agora, a melhor coisa desse trabalho, era poder “go ashore” que significa “desembarcar”, “ir à terra”. Os dias no navio eram diferenciados por dias de mar e dias de porto. Nos dias de mar, tínhamos que trabalhar normalmente, sem possibilidade de horas de folga (hours off). Já nos dias de porto, havia um revezamento, metade de uma equipe tinha algumas horas de folga, enquanto a outra metade trabalhava. O inverso acontecia no próximo dia de porto. Ou seja, torcíamos para que num cruzeiro houvesse muitos dias de porto. Assim, podíamos nos sentir livres novamente e apreciar lugares maravilhosos, como vários que conheci.

Alaska, Seattle, São Francisco, Vancouver, México, Hawai, Polinésia Francesa, Costa Rica, Porto Rico, Equador, Peru, Chile, Argentina, Uruguai, Nova Zelândia, Austrália, etc...


      
    
  


Uma das coisas que também servia como fuga para a tripulação, era ter um relacionamento amoroso. A política era clara. Relacionamentos pessoais só eram permitidos entre os tripulantes, staffs e oficiais – não com PASSAGEIROS. É claro que essa regra só valia mesmo para nós, da tripulação, e para alguns staffs, não para os oficiais que sempre davam um jeitinho de burlar essa política.

Amizade era bem comum entre tripulação e passageiros. Afinal de contas, convivíamos de uma semana a um mês com as mesmas pessoas e as conversas informais e trocas de experiências eram inevitáveis. Tive muito contato com passageiros de todo o mundo, inclusive do Brasil. Passageiros adoravam ouvir experiências contadas por tripulantes e sempre perguntam dicas de atividades para se fazer num cruzeiro.

       

Diferente de mim, que estava naquela vida para viajar, conhecer novos lugares e pessoas, e ter uma nova aventura, grande parte da tripulação trabalha nesses navios de cruzeiros por necessidade. Pessoas vindas de países com problemas econômicos como os da Ásia, Leste Europeu, América do Sul, entre outros, era o mais comum. No total, são mais de 40 nacionalidades trabalhando todas juntas, ou seja, pessoas com culturas totalmente diferentes tendo que conviver umas com as outras de modo civilizado, sem conflitos. Caso contrário, elas poderiam ser enviadas de volta as suas casas a qualquer momento, principalmente se tratando de “má-conduta”.

      
Aqui tem brasileiro, mexicano, portugues, peruano, filipino, ucraneano,
tailandês, indonésio, esloveno e búlgaro.

Uma das coisas mais difíceis de adaptar é com o “vai e vem” do mar. Fiquei mareada diversas vezes. Vivia com dor de cabeça e ânsia de vômito. Havia dias em que o mar, combinado com uma tempestade forte, virava um mostro que parecia querer engolir o navio. Era o que parecia para mim (rs), que era marinheira de primeira viagem “literalmente”, não para aqueles que já estavam acostumados.


Este é um dos vídeos que fizemos num dia em que o mar estava revolto. Fiquei morrendo de medo. Veja o que aconteceu no 1min30 de filmagem.





Mas foi em alto mar também, onde eu vi os melhores pôr e nascer do sol. Um mais lindo que o outro.


Lembro de quando chegamos às Ilhas Samoa, na Polinésia, fazia uma senama que um tsunami com ondas de mais de três metros havia arrasado vários povoados por lá. Foi lamentável ver toda aquela destruição. 

Fotos de Samoa após o tsunami

Houve um dia em que eu senti muito medo. Foi quando já estávamos a dois dias para chegar em Valparaiso/Chile, quando fomos surpreendidos com a notícia de que um terremoto fatal atingiu o Chile, este com magnitude de 8,8 graus na escala Richter, provocando a morte de mais de 802 pessoas. O cruzeiro em que estávamos terminaria em Valparaiso, onde outro começaria, ou seja, cerca de 2000 passageiros iriam desembarcar e mais outros 2000 iriam embarcar. O clima no navio ficou péssimo. Quando os passageiros souberam da notícia criou-se um pânico geral, inclusive entre os passageiros Chilenos, que tinham suas casas e famílias por lá. Os que estavam embarcados não queriam desembarcar e vice-versa. Ficamos quatro dias embarcados no porto de Valparaiso. No segundo dia, pudemos sentir um dos pequenos tremores que ainda aconteciam na região. Foram dias que nunca irei esquecer.

Apesar da piscina, dos ofurôs, das várias atividades de entretenimento e daquele ambiente rico em cultura dentro do qual eu estava inserida, os meses demoravam a passar. No final do sexto mês eu já não agüentava mais aquele trabalho e não via a hora de ir para a casa, de sair daquela prisão. Percebi que mesmo conhecendo lugares lindos e vivendo coisas novas, nada daquilo pagava a minha liberdade de ir e vir de qualquer lugar sem ter que dar satisfação ou pedir permissão para alguém. Sentia como se estivesse sendo vigiada e controlada o tempo todo, e na verdade, de certa forma, eu estava.

Lembro que no meu último dia, não deu tempo de começar a trabalhar no horário. Estava tentando arrumar minhas malas, mas precisava de mais tempo livre. Então pensei: “Ah, hoje é o meu último dia mesmo e já tem outra pessoa no meu lugar. Quem vai se importar se eu me atrasar um pouco?...”. Mas me enganei. Enquanto estava na cabine, na primeira hora em que eu deveria estar trabalhando, recebi umas quatro ligações, a começar da minha encarregada e, pra concluir, o Maitre do navio que, gritando, me disse coisas absurdas do tipo: “Pensei que você era mais responsável, mas vi que me enganei”, ou “Quem você pensa que é? As leis do mar são rígidas. Você não pode deixar de trabalhar nem um minuto sequer”, e a pior “Fique na sua cabine. Eu não quero vê-la até a hora de você partir amanhã”. Estava tão aliviada de estar indo embora que nem me abalei e curti meu último dia sem trabalhar (rs). No dia seguinte, quando fui assinar os papéis para o desembarque, só se falava nesse assunto “a Viviane não foi trabalhar e ainda discutiu com o Maitre (um dos homens mais respeitados e temidos do navio).” Eu mereço, né?

Enfim, experiências têm que ser vividas. Aproveita-se o que é bom, aprende-se com o que não deu certo e descarta-se o que é ruim ou o que não te acrescenta em nada. Essa experiência foi única. Afinal de contas, não é sempre que temos a oportunidade de morar em alto mar por seis meses, convivendo com pessoas de mais de 40 nacionalidades diferentes e conhecendo lugares ma-ra-vi-lho-sos pelo mundo.

Foi ótimo! Agora, qual será a minha próxima aventura?

Viviane Brizzi